quarta-feira, 8 de fevereiro de 2012

SINDROME DE OTELO: CIUME PATOLÓGICO

Por Cleonice Andrade



Otelo, o mouro de Veneza, é uma obra de William Shakespeare escrita em torno de 1603.  A história gira entre quatro personagens, Otelo, sua esposa (Desdêmona), o tenente Cassio e o suboficial Iago.  História em que muitas pessoas se identificam ainda na atualidade. Trata-se de traição, inveja, amor e racismo. Iago odiava Cassio e Otelo começou então a semear discórdia, jogando um contra o outro. Induziu Otelo a acreditar que sua esposa estava tendo um caso com Cassio. Otelo enciumado começou a colher evidencias e desconfiar de Desdêmona. Evidencias estas criadas por Iago que jurando lealdade ao seu general prometeu vingança e matar Cassio, tentativa mal sucedida, pois conseguiu apenas feri-lo. Otelo totalmente descontrolado procurou sua esposa e asfixiou-a até a morte. Em seguida, esposa de Iago confessou todo o plano de seu marido para destruí-lo, mas quando ele descobriu a inocência da esposa já era tarde.

A peça de Shakespeare traduz um acontecimento que se repete ainda nos dias de hoje. De todos os tormentos que afligem o ser humano, o ciúme é um dos mais difíceis de tolerar e de controlar. Vários relacionamentos acabam em morte, mas isso não acontece somente nos casos mais graves. Nenhum relacionamento está livre de desconfianças. O sexo está cada vez mais presente na vida das pessoas sem muito esforço para conseguir. Essa liberdade sexual favorece esse sentimento tão devastador. Basta assistirmos o noticiário para percebermos que o ciúme passional tem aumentado. Os prejuízos causados são graves, moderados e leves, mas todos acompanhados de muito sofrimento para todos os envolvidos.

O que significa o ciúme patológico? É um sentimento humano muito comum que se manifesta praticamente em todas as pessoas. O que diferencia o normal do patológico é a intensidade com que essa emoção se apresenta e o grau de prejuízo causado na vida de alguém.  Trata-se de uma reação perante uma ameaça percebida de perder uma relação muito valorizada, é o medo de perder alguém que ama. Pode envolver três ou mais pessoas e o objetivo do ciumento é eliminar todos os riscos que possam levar a perda do objeto amado.

Na psiquiatria o ciúme aparece como sintoma em diversos transtornos psicológicos, enquanto o ciúme normal é passageiro o patológico é desproporcional, intenso, absurdo, acompanhados de comportamentos bizarros, agressivos e escandalosos. Nesse tipo de ciúme há uma  mistura de emoções como vergonha, ansiedade, raiva, depressão, humilhação, culpa.  O ciumento(a) sente-se inseguro(a), vulnerável, sensível, com baixa auto-estima e baixa autoconfiança, desconfiado(a), não acredita que pode ser verdadeiramente amado(a), aceito(a) e valorizado(a) e tem muito medo de ficar sozinho(a). Essa pessoa vive em estado de alerta, procurando nas carteiras e bolsos ou bolsas provas que comprovem seus pensamentos, investigando, ouvindo telefonemas, olhando celular, procurando evidencias de traição nas roupas do outro, descobrindo senhas e acessando as redes sociais do parceiro (a) e até respondendo e-mails suspeitos, há verificações compulsivas em função de suas dúvidas. Algumas pessoas ainda contratam detetives, brigam muito e cobram com muitos questionamentos, tudo para amenizar seu sentimento desconfortável. Mesmo sabendo que são atitudes infantis e ridículas, além de provocar sofrimento e irritação no parceiro(a) ainda assim a pessoa não consegue minimizar esses comportamentos que continuam até o relacionamento terminar caso não haja tratamento. Como ela não acredita ser digna de amor e experimenta um sentimento de ”como se fosse descartável”, as interpretações que faz das situações são facilmente distorcidas. Acredita nas primeiras interpretações que vêm a sua mente sem questioná-las e impulsivamente responde a essas situações com comportamentos baseados em pensamentos que para ela parecem verdadeiros. As vezes distorce até mesmo situações que poderiam ser consideradas por outros uma demonstração de amor. Por exemplo: o namorado oferece um boque de rosas, enquanto um interpreta essa atitude como sendo um sinal de amor, o ciumento pode interpretar que o parceiro está fazendo isso porque “deve ter aprontado alguma”. Aqui as dúvidas são verdadeiras, não há talvez e sim certeza. Estão sempre buscando algo que possa confirmar suas suspeitas estragando assim o que mais tentam defender, a sua felicidade e paz. Certamente tentar manter um relacionamento duradouro com comportamentos de ciúme não a melhor estratégia.

Há evidencias e estudos comprovados que a terapia cognitiva comportamental é uma das abordagens mais indicadas para esses casos. Não desmerecendo outras abordagens que também podem ajudar. O ciúme patológico é um problema que atinge milhares de pessoas, é tratável e com grandes possibilidades de melhora. Porém é importante mencionar que prestem atenção na escolha do profissional, este deve ser qualificado, experiente e treinado. Antes de acabar com um relacionamento com atitudes que não está podendo controlar no momento esteja ciente de que se trata de uma doença que pode ser tratada.

Cleonice Andrade
Psicóloga/especialista: terapia cognitiva comportamental
CRP:12/04023


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